terça-feira, abril 01, 2008

Dança da chuva
Wander Motta

E choveu...
e choveu...
Durante longos meses choveu e choveu.
Rios e mares encontraram-se num só curso.
E inundaram, e destruíram, e tudo invadiram.
E povos inteiros pereceram.
Mãos para os céus rogaram preces.
Profetas diziam que tudo estava escrito, e agarrados às suas profecias, submergiam.
Boatos corriam que crianças com nadadeiras nasciam, e que ricaços em transatlânticos partiam... para onde iriam?
E... choveu,
e... choveu...
E, quem sobreviveu... com a intempérie aprendeu!
E reprojetaram, e reinventaram, e reciclaram, e tudo reconstruíram.
E da água comeram, da água beberam.
E, quem diria? A água já não mais temiam.!
Até que... um dia...!
A chuva cessou...
E o sol novamente brilhou...
E as águas retrocederam...
E rios e mares aos seus cursos verteram...
Profetas emergiam bradando “eu já sabia!”, e bisonhamente sorriam...
Boatos corriam que das crianças as nadadeiras caíam.... e que transatlânticos de luxo numa floresta jaziam.
E o sol brilhou
e brilhou...
E as casas voltaram a ser casas, as ruas voltaram a ser ruas, os povoados voltaram a ser povoados...
Barcos, obsoletos, dos telhados foram retirados...
E o sol brilhou e brilhou por longos meses...
Brilhou,
brilhou...!
E o rio secou...
A colheita não vingou...
E a fome imperou...
Mãos para os céus rogaram preces...
De onde tirar sustento, aplacar a sede?
E povos inteiros pereceram...
E, nas noites quentes da única estação que restou...
Ouviam-se o chacoalhar de corpos suados...
Ao tenso ritmo da dança da chuva...

Um comentário:

Unknown disse...

Brilhante jogo de palavras num ciclo, em se falando da natureza desrespeitada, completamente provável.